Ela não resistia aos encantos de um anúncio que costumava soar das caixas de som velho, daquelas que você mais ouve os chiados do que a própria voz do anunciante, que são interrompidas várias vezes por músicas bregas dos anos 80, sob o teto de um carro também velho e popular, vendendo frutas, legumes, verduras, queijo branco, peixe fresco, pães, churros, produtos de limpeza ou oferecendo consertos de panelas, mas, naquele dia, ela foi até o portão, abriu e recebeu em mãos do vendedor aquilo que ela costumava a comprar sempre, sendo chamada com muito carinho pelo nome, daquele vendedor que circulava pelo bairro oferecendo seus produtos a 20 anos: "Já sei dona Rosa, a senhora quer uma pamonha doce e outra de sal não é!?". Dona Rosa respondeu apenas com um sorriso. Ele conhecia cada freguês ou frequesa e sabia o que cada um gostava.
Ela pegou as duas pamonhas, mandou 'pendurar na conta', caminhou de volta pra dentro da sua casa e sentou-se com seu Mauro, seu marido, na mesa da cozinha pra tomar o café da tarde e discutir sobre as contas à pagar da casa.
O casal espalhou os talões de conta de luz, água, telefone, internet, mensalidade do curso dos filhos e os carnês das lojas sob os farelos que caiam do pão que seu Mauro comia, que manipulava uma calculadora, somando o total de cada conta, pra depois decidirem junto a melhor forma de pagar cada uma.
Mas em seguida tiveram que se levantar da mesa e atender os chamdos que vinham do fundos da casa: Socorro, socorro". Dona Rosa disse: "Vem da casa dos vizinhos" .
Seu Mauro encostou a cadeira no muro, subiu nela e viu dona Emilia de joelhos clamando por ajuda, diante do seu marido deitado no chão com uma mão esticada e outra no peito, respirando fundo, com dificuldades.
Seu Mauro pulou o muro num movimento ríspido, num só salto, meio desiquilibrado, mas encorajado num espírito salva-vidas, tipo um menino em busca de uma pipa, mas já era tarde. Seu Antônio, marido de dona Emília, respirou bem mais fundo, suspirou com força esbugalhando os olhos, tirou a mão do peito deixando-a cair no chão, relaxando as pernas e se entregando a morte.
Dona Emília e seu antônio era um casal com mais de 60 anos, vizinhos de fundo, cujo a frente da casa dava de frente a linha férrea, na avenida Nagib Gabriel. Seu Antônio fumava demais, além de ter o péssimo hábito de tomar cachaça todos os dias, com a desculpa de ser um aperitivo para abrir o apetite minutos antes do almoço, ruím é que ele abusava desse aperitivo.
Mais tarde..
"Pior do que saber da morte de um amigo (vizinho), é presencia-la, de perto", se queixou dona Rosa cabisbaixa enxugando as lágrimas, sentando-se na cama, com um copo de água na mão e um comprimido na outra e, seu marido, já deitado e pronto pra dormir, também cabisbaixo, mas sem chorar, virou-se e complementou: "Pior do que saber ou presenciar a morte de um amigo, é saber que ela levou dois vizinhos em menos de 15 dias nesse mesmo quarteirão".
Ambos se olharam e silênciaram-se num momento de reflexão até chegar o sono.
A morte realemnte tava passeando . Belo texto . Flando nisso uma vizinha nossa morreu , e a outra tá prestes a morrer. A que morreu era uma colega da minha mãe , e outra que tá quase morrendo é a minha avó. Coisas da vida , ops , da morte.
ResponderExcluirde vez em quando eu me esqueço de comentar com a conta certa de blogger , essa é a "Lucas Stefano" ( o coment acima . ) . Rumo aos 10 mil visitantes.
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