supercrônico

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crônicas, contos e poesias

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Precipício

oOOOOLÁÁÁÁ

E o individuo respondia:

OOOOLÁÁÁÁ

Começava-me criar antipatia diante daquele sujeito que repetia por inteiro toda frase que eu falava e além de repetir, ele repetia também a última silaba, da última palavra, no mesmo tom da minha voz, a frações de segundo após eu dar gritos e que não se identificava,  não sei se a voz era masculina ou feminina, só sei que não dizia quem era e muito menos  seu nome.
EI VOCÊ!
E a voz retornava a meus ouvidos
EI VOCÊ... CÊ... CÊ!
Revoltei-me e comecei a atirar pedras em sua direção, que se espatifava nas rochas do vale.
Aproximava-me cada vez mais e a cada passo esbugalhava os olhos a sua procura.  Minutos depois Retornei a atirar pedras, mas desta vez nas moitas que beiravam o paredão rochoso, desconfiado, achando que talvez pudesse estar escondido em uma delas, mas de nada resolvia, se estivesse escondido em alguma daquelas moitas que beiravam o paredão rochoso, com certeza eu lhe acertaria, bem na cabeça, pois a ira que me causara naquele momento era bem forte, a ponto de desmoronar os montes sobre as flores da planície verde, reluzida pela luz do sol daquele fim de tarde.
Conforme o tempo ia se passando, o sujeito ia me vencendo pelo cansaço, e começava a me sentir um idiota.
QUEM É VOCÊ? DIGA-ME POR FAVOR? O QUE QUER COMIGO?
E o individuo repetia com a voz já fraca, mas sem deixar de repetir o que eu dizia.
QUEM É VOCÊ... CÊ... CÊ? DIGA-ME POR FAVOR... VOR... VOR? O QUE QUER COMIGO... MIGO... MIGO?
Esse deve ser um cara debochado, daqueles que riem átoa, de tudo, de todos  e não tem nada pra fazer além disso, pensava. Pois daí eu resolvi esperar que me dissesse algo para que eu repetisse, para que sentisse o quanto era ruim passar por idiota e ser motivo de chacota por alguns instantes.
TIC-TAC, o tempo foi passando e eu sentado em uma pedra esperando e  nada desse indivíduo aparecer.
Já deve ter ido embora, presumia, pois deve ter se cansado assim como eu e não ficou para esperar chamá-lo novamente, no mínimo tivera percebido que eu queria me vingar da tal brincadeira sem graça, com a mesma brincadeira. Mas horas depois Decidi também ir embora, mas antes lhe chamei outra vez, somente para certificar-me se realmente ele tinha ido ou não embora antes de mim.
EI VOCÊ, POR ACASO AINDA ESTA PRESENTE?
E não é que o fulano correspondeu-me. Na verdade o mais esperto foi ele, que pacientemente me esperou pra me dar a cartada final daquela brincadeira toda.
EI VOCÊ... CÊ... CÊ, POR ACASO AINDA ESTA PRESENTE... ZENTE...  ZENTE?
Putz! A antipatia se transformou em simpatia e comecei achar tudo aquilo engraçado. Eu já nem era mais aquele irritado de horas antes a ponto de estrangular o desconhecido.
RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ
Deitava-me e ria.
RÁ, RÁ, RÁ, RÁ, RÁ
E o sujeito também se matava em gargalhadas junto comigo.
Quase sem fôlego e com os olhos chorosos de tanto dar risadas, juntei minhas coisas para partir de volta para a casa e junto ao cansaço que me esgotava, veio o frio, a fome e o medo da altura. Abanei as mãos em direção ao desconhecido me despedindo, embora não sabia onde ele estava, quem era, daonde veio e qual era seu nome, baixinho e falando comigo mesmo lhe falei:
Prazer em conhecê-lo e obrigado pela companhia”
Ele não repetiu, creio que não ouviu, porém foi muito baixo, não se despediu de mim e lentamente desci do alto daquele precipício.

Vagner Zaffani-(texto-15)
12/05/2003


2 comentários:

  1. Somente a solidão nos faz conversar com o próprio eco e fazer dele uma ótima companhia.

    abraçooos

    (Vagnão)

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