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crônicas, contos e poesias

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Circular Santa Fofoca

Corri, me apressei, pois já era 7:10 da manhã e lá vinha ele, virando a esquina da Joaquim Marques Alves, lotado, com passageiros se expremendo em busca de um lugar confortável em um dia de calor intenso. Caso  eu perdesse esse, outro só dalí a 20 minutos  e assim por diante até ao meio dia.  Ele entrou na Regente Feijó assim que eu passei pela roleta, com a passagem já paga, sentei em um banco duplo vazio, desocupado por dois que desceram no mesmo ponto que eu embarquei, que logo também foi ocupado por uma senhora com uma bolsa transversal no ombro que, educadamente, sentando ao meu lado me deu bom dia, reclamou do calor e se queixou de uma vizinha que não pagará a prestação de uma geladeira velha usada, que  tivera vendido. Depois falou que a vizinha além de não pagar a geladeira, não quer mais trabalhar, que sai com outro enquanto o marido trabalha a noite de táxista, que deixa as folhas que caem seca da árvore na calçada sem varrer, que sua filha de 5 anos esta com piolho e reclamava também de uma turma de garotos que ouviam funk cairoca do celular, nos bancos do fundo.
Atrás de mim um velho tossia e reclamava que, o médico lhe receitara o remédio errado para a sua tosse, que o ônibus coletivo não tinha ar condicionado, que o motorista freava bruscamente, fazendo que os passageiros apertados se misturassem trocando de lugar um com o outro, que seu patrão lhe obrigava a trabalhar mais que as suas 8 horas devidas e que sua aposentadoria não saia. Uma outra toda perfumada, com o cabelo vermelho cobre e as raízes pretas por pintar, usando salto e um vestido amarelo que subia toda hora, dizia para uma moça negra  que lhe acompanhara, que a melhor amiga comprara um vestido igual a dela, por pura inveja, mas que o seu era original da marca enquanto o da melhor amiga não era, e as duas riam debochando do fato, isso porque era a melhor amiga. Um homem de gravata pregava o evangelho com a bíblia aberta, mas sua voz se perdia entre o som do celular dos garotos do fundo e as conversas paralelas dos demais alí dentro.
Minutos depois, de ponto a ponto, o onibus sobrecarregou mais ainda sendo ocupado até o pequeno espaço do motorista bigodudo, fazendo que o calor e o cheiro de marmita quente, misturado com o cheiro de perfume barato  da moça ruiva de amarelo se espalhasse pelo interior do coletivo.
Dentro do ônibus é um barato, tudo é caro, se chove é ruim, se faz calor também, ninguém é bom, nenhum hospital, assim como nenhum trabalho, assim como nenhuma linha de ônibus coletivo que transportara todos pra lá e pra cá nessa cidade grande todo santo dia.
Logo o ônibus que eu estava, entrou na Pedro Amaral e adentrou o terminal rodoviário. Os passageiros se tumultuaram na porta, apreensivos e com medo de perder o outro, da linha que os levam ao trabalho sempre. A porta se abriu e quando eu achava que todas as reclamações e fofocas tinham terminado eu ouvi alguém falar; " Pelo amor de Deus motorista (pobre do homem), não da pra parar mais próximo a guia? Não empurrem... Não empurrem..."
Dentro do terminal tinha vários deles estacionados, uns prontos para sair, uns embarcando, outros desembarcando, mas todos com a cor azul, branco e com detalhes alaranjados, adesivado com o nome da empresa em toda extensão das laterias, mas que eu chamo carinhosamente de Circular Santa Fofoca.

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